Bert Hellinger nos fala da “arte” da ajuda (As Ordens da Ajuda – Atman Editora), como uma faculdade que, por um lado, pode ser aprendida e por outro, exige do ajudante uma sensibilidade para compreender aquele que procura ajuda. Compreender o que é adequado no momento, o que dá e o que tira força, o que pode erguer o que procura ajuda acima de si mesmo, para “algo mais abrangente”.
Ele vê a ajuda como compensação, como algo que serve não só ao que recebe mas ao que doa. Em relação aos nossos pais, esta “compensação” diante do presente grande demais que recebemos deles, a nossa própria vida, só é possível através do passar adiante para os nossos próprios filhos, para a vida que segue.
Portanto, o tomar e o dar, diz ele, “acontecem em dois níveis, entre pessoas equiparadas, exigindo reciprocidade e entre pais e filhos, superiores e necessitados, quando o tomar e dar se assemelha a um rio que leva adiante o que recebe em si”.
Essa ajuda última, pressupõe que nós tenhamos recebido e tomado, somente assim teremos a necessidade e a força de ajudar outros.
Percebemos, com freqüência, nas Constelações Familiares, situações onde, por diversas razões, o “filho” não tomou dos pais, ou de um deles, tudo que deveria, ficando portanto com este bloqueio no fluxo natural do amor e da ordem, com prejuízo para o seu desenvolvimento e amadurecimento, revelados, muitas vezes, na dificuldade em dar, em passar adiante e também em receber de forma madura.
Focando principalmente na “ajuda” no âmbito da terapia, Bert Hellinger nos apresenta as suas “Ordens da Ajuda”:
1ª- “Dar apenas o que se tem e somente esperar e tomar o que se necessita”.
Portanto a desordem aqui acontece quando uma pessoa quer dar o que não tem, e a outra quer tomar algo de que não precisa. Também ocorre quando uma pessoa não pode dar algo porque tiraria da outra algo que só ela pode ou deveria fazer.
Portanto, existem limites no dar e no tomar. Pertence à arte da ajuda, nos diz B. Hellinger, percebê-los e se submeter a eles.
2ª- “Nos submetermos às circunstâncias e somente interferir e apoiar à medida que elas o permitirem.”
Olhar junto com aquele que procura ajuda, pois o querer ajudar contra as circunstâncias enfraquece tanto o ajudante quanto aquele que espera ajuda ou a quem ela é oferecida ou, até mesmo, imposta.
Na situação de uma doença hereditária, por exemplo, ou nas conseqüências de acontecimentos gerando circunstâncias externas e internas inalteráveis, não admiti-las leva a ajuda ao fracasso.
...”Para muitos ajudantes o destino do outro parece difícil e querem então mudá-lo, nem tanto porque são procurados para tal , mas porque o próprio ajudante não consegue suportar este destino. E quando o outro, mesmo assim, se deixa ajudar por eles, não é tanto porque precise disso, mas porque deseja ajudar o ajudante. Então esta ajuda se torna tomar e o tomar a ajuda, doar”.
A ajuda na relação entre pais e filhos.
“ Os pais dão e os filhos tomam. Os pais são grandes, superiores e ricos, os filhos pequenos, necessitados e pobres.”
Bert Hellinger nos fala aqui do profundo amor mútuo que liga pais e filhos em que o dar e o tomar podem ser quase ilimitados. Os filhos podem esperar quase tudo de seus pais e os pais estão dispostos a dar quase tudo aos seus filhos. Isto é necessário, na sua opinião, é a ordem nesta relação. Entretanto, alerta, “é a ordem enquanto os filhos ainda são pequenos, pois com o avançar da idade, os pais devem ir colocando limites aos filhos, com os quais estes podem entrar em atrito e dessa forma, amadurecerem.”
Colocar limites então, é a condição para que os pais possam preparar os filhos para a vida
de adultos e isto é prova de um grande amor. Muitos filhos ficam com raiva de seus pais porque preferem manter a dependência original, contudo “é justamente porque os pais se retraem e desiludem essas expectativas, que ajudam seus filhos a se libertarem dessa dependência e, passo a passo, a agirem por própria responsabilidade.” Somente assim, continua, “os filhos tomam o seu lugar no mundo dos adultos e se transformam de tomadores em doadores”.
3ª – “Colocar-se como adulto diante do adulto que procura ajuda; evitar a relação de transferência com os pais”.
Bert Hellinger neste tópico nos alerta sobre os riscos de querermos substituir os pais daqueles que nos procuram para ajuda, evitando assim as chamadas transferência e contra-transferência. Ressalta porém as condições em que, momentaneamente damos continência enquanto ajudantes, ao sentimento expresso por aquele que teve precocemente um movimento interrompido em direção aos pais. Neste momento estamos representando os pais reais do cliente, sem pretensão de ser melhor ou maior que eles, evitando assim o desprendimento dele de seus pais reais.
Quando lidamos com crianças, a mesma observação é válida e ao estabelecermos sintonia
com os pais reais, respeitando-os “de coração”, a ajuda pode ser eficaz mesmo que momentaneamente temos que representar para elas, os pais afastados numa situação de interrupção prematura do movimento em direção aos filhos.
“A desordem neste caso seria permitir que um adulto faça reivindicações ao ajudante como uma criança aos seus pais, e que o ajudante trate o cliente como uma criança, para poupá-lo de algo que ele mesmo precisa e deve carregar – a responsabilidade e as conseqüências”, afirma Bert Hellinger na obra já citada.
4ª- “A empatia do ajudante deve ser menos pessoal e sobretudo sistêmica”.
Não se envolver pessoalmente com o cliente, esta a 4ª ordem da ajuda, segundo Bert Hellinger, mas vê-lo fazendo parte de uma família. Desta forma o ajudante pode, ao entrar em sintonia com o campo familiar do cliente, perceber quem nesta família precisa realmente de ser respeitado, visto e a quem o cliente precisa se dirigir para reconhecer os passos decisivos e caminhar.
Muitas vezes esta “empatia sistêmica” é sentida como dura pelo cliente, particularmente quando este está manifestando reivindicações infantis. Ao contrário aquele que procura uma solução, de maneira adulta, sente o procedimento sistêmico como uma “libertação e uma fonte de força”.
Na relação professor-aluno a observação desta “ordem” é fundamental para que o professor-ajudante possa encontrar soluções nos conflitos trazidos pelo aluno-cliente, geralmente frutos de emaranhamentos familiares complexos. À medida que o professor está mais em contato com sua própria ordem familiar, estará mais preparado para esta ajuda diante do aluno e da escola.
5ª- “O amor sem julgamento”.
Sair do julgamento, da diferenciação entre os bons e os maus, da preocupação com a “opinião pública” são instrumentos imprescindíveis para ampliarmos nossa consciência e agir de forma profunda na ajuda que pretendemos. Estar a serviço da reconciliação e não do
conflito é dar imediatamente espaço no coração para aquele que é criticado pelo cliente, acusado de algoz de seus pretensos males. Neste caso, se damos lugar na nossa alma àquele que é alvo da crítica do cliente, estamos antecipando o que ele ainda precisa fazer, o movimento em direção à reconciliação.
Observação, percepção, compreensão, intuição e sintonia.
Bert Hellinger, ao discorrer sobre estas “qualidades” do ser humano, nos orienta sobre a “gama de possibilidades” no ato de ajudar.
A observação é “aguda, precisa e direcionada para os detalhes”. E por ser tão precisa, ele diz, “é também limitada, próxima, resoluta, penetrante e, de certa forma, impiedosa e agressiva”. É a condição para a “ciência exata e para a técnica moderna”, conclui.
A percepção é “distanciada”. Embora seja imprecisa nos detalhes, abrange a vista, vê o todo, os detalhes, mesmo imprecisos, ao seu redor e no seu lugar, percebe simultaneamente várias coisas. Um outro lado da percepção é que ela “entende o observado e o percebido ... ela vê por trás do observado e percebido, entende o seu sentido, acrescentando à observação externa e à percepção, uma compreensão”. A compreensão “pressupõe observação e percepção”. Sem a observação, afirma, “o observado e percebido permanecem sem relação”. A observação, a percepção e a compreensão compõem um todo, na opinião de Bert Hellinger e apenas quando atuam juntas é que “percebemos, de forma que podemos agir de um modo significativo e sobretudo, também ajudar de um modo significativo”.
A intuição é “a compreensão súbita da próxima ação a ser realizada”. Enquanto a compreensão, neste conceito, é mais geral, entendendo todo o contexto e todo o processo, a intuição, ao contrário, reconhece o próximo passo e por isso é exata. A relação entre a intuição e a compreensão é semelhante à relação entre a observação e a percepção, na sua opinião.
A sintonia é “a percepção que vem de dentro, em um sentido amplo”. Está também direcionada a uma ação, principalmente a uma ajuda que conduz à ação. A sintonia exige que “eu entre na mesma vibração do outro, que
chegue à mesma faixa de onda, sintonize com ele e, assim, entenda-o”. Para entendê-lo, preciso também entrar em sintonia com sua origem, principalmente com seus pais, mas também com seu destino, suas possibilidades, seus limites, com as conseqüências de seu comportamento, sua culpa e, finalmente, com sua morte.
Então eu posso de fato ser o instrumento preciso e adequado da ajuda, numa ordem superior:
“ Em sintonia, eu me despeço de minhas próprias intenções, meu
julgamento, meu superego e daquilo que ele quer, DO QUE EU DEVO E PRECISO FAZER. Isso quer dizer: eu chego à mesma sintonia comigo e com o outro. Dessa forma, o outro também pode entrar em sintonia comigo, sem se perder, sem precisar ter medo de mim. Também posso estar em sintonia com ele e permanecer em mim mesmo. Não me entrego a ele, em sintonia com ele conservo a distância e, exatamente por isso, posso perceber precisamente o que eu posso e devo fazer, quando eu o ajudo. Por isso a sintonia é também passageira. Dura somente o tempo que dura a ação que ajuda. Depois disso cada um volta à sua vibração especial. Por isso, não existe na sintonia transferência nem contratransferência, nem a chamada relação terapêutica, portanto, nenhuma tomada de responsabilidade pelo outro. Cada um permanece livre do outro.”
Estas observações, percepções, compreensões, intuições de Bert Hellinger, embora mais direcionadas à ajuda no processo psicoterapêutico, estão em sintonia, na minha opinião, com a ajuda também na relação professor-aluno. Tomar consciência destas qualidades inerentes e/ou passíveis de aprendizado e treinamento, podem contribuir para um processo educacional que contribua para a formação do Ser Humano.
Dagmar Ramos é médica homeopata e facilitadora das Constelações Familiares.