domingo, 14 de julho de 2013

Desfazer laços para desfazer nós

Recebi uma foto de uma menina que perdeu a mãe na guerra e no chão do pátio do orfanato desenhou com giz a figura de uma mulher e depois se deitou sobre a mãe simbólica como buscasse se aconchegar no colo daquela que não existia mais... Ficou ali parada como se estivesse sendo acolhida da profunda sensação de desamparo e saudade que carregava em si.


                            

Esta imagem da menina sobre a mãe de cimento, a mãe onírica me comoveu a ponto de revê-la algumas vezes. Quando a tinha sob os meus olhos me reportava aos conceitos sobre nossa vida intrauterina e toda a correlata condição de perfeição que vivenciamos durante esses nove meses e me levei também a pensar sobre a nossa necessidade psicológica de ter um “outro” em nossa vida que nos propicie a sensação indispensável de amparo.

Qualquer ser deseja encontrar alguém em que se possa confiar e contar.Quem deixa de sonhar com esse amparo?

Conquistar esta certeza do outro apazígua nossas inseguranças e fortalece nossa confiança para se viver o cotidiano. Necessitamos beber dessa fonte de amparo, assim como necessitamos de água.

As mães sem nome, aquelas que perderam os filhos por alguma doença ou acidente que agora irão receber a benção do Papa, representam na união entre elas, essa busca para a formação do colo acolhedor e apaziguador desenhado pela menina órfã.
Quando nascemos somos muito abraçados e por vezes com o tempo esses abraços se tornam rarefeitos e se reduzem a esbarrões ou toques da vida sexual.

A modernidade exacerbou o conceito da formação do self e da autonomia absoluta onde a necessidade pelo outro passou a ser considerada como algo neurótico. Ideias como: “Se você pode fazer sozinho... Então faça!”

“Você deve desenvolver o Self Service: autonomia; liberdade absoluta; se amar e se bastar totalmente”.
A amplitude deste conceito foi tão difundida que trouxe em muitos o constrangimento em admitir a necessidade de sentir que pertence a alguém ou que necessita de um olhar de apoio e amparo. 

A mentalidade do self distorcida de servir por si, de viver por si trouxe esse sentimento de solidão acompanhada que as pessoas carregam atualmente.
Quantos estão cercados de pessoas, inseridos em vidas sociais e profissionais, mas com medo de criar vínculos, com medo de aprofundar as relações pelo medo de criar a dependência? Muitos aderiram a esta ideia de independência absoluta sem perceberem as consequências emocionais negativas que derivam daí. Estão plenos fora, mas impedidos de se alimentar dentro.

Estão ligados, mas sem conexão.
Não se vai fundo nas entregas para preservar a autonomia. 
O que isto gerou?

- A sensação de desamparo - A sensação de solidão acompanhada.
Desfizeram os nós neuróticos da simbiose, mas esqueceram de manter os laços.
Criou-se a “Síndrome do Eu” e a “Sociedade do Fico, Mas Não Permaneço”, onde se está longe de oferecer a certeza das permanências.
No mundo atual, o corpo objetivo se relaciona, mas o corpo subjetivo está impedido por este conceito de modernidade de viver os elos. 

Eis o lema de uma falsa psicologia: “Independência em tudo ou morte das relações e obrigações”.

Clarice Lispector tem a expressão “Somos o Outro do Outro”, onde preserva a si quanto ao risco da absoluta fusão, mas sem invalidar que para ser um eu deve haver o outro que nos une e com isso diferencia.

A ideia de treinar a independência absoluta congela a nossa humanidade e traz a dificuldade de entrega que atualmente assistimos nas relações de amizade, sociais e íntimas.
Para se desfazer os nós que atavam as pessoas até os anos 50, numa condição de anulação e recalque, esqueceram de preservar os vínculos. Esqueceram os laços ao desfazerem os nós.

Hoje considerados “espertos” são os desatados, são os “Self Live Emotion”.
Somos feitos das misturas desde o óvulo e o espermatozoide que se fundem através do abraço profundo de dois corpos que se tornam nossos pais. Evidente que para nascermos temos que sair do outro, mas para encontrar logo outro que nos acolha, ampare e depois tantos outros que nos ensinam... e de outro em outro nos tornamos o Eu.

Um Eu capaz de se preservar, mas capaz de se entregar.

Numa matéria de capa de uma Revista de Domingo, discorrem os depoimentos sobre as dores vivenciadas nas perdas e no consequente doloroso rompimento dos laços e ali se vê o papel fundamental dos novos elos que são gradualmente estabelecidos para se manter o laço com a vida.

Você precisa de ar para respirar, vai treinar poucas quantidades para não ser dependente? 
Vai tentar se bastar sem água? Sem proteínas?
Apenas para não ser dependente vai se tornar anoréxico? 
Para evitar os excessos se mergulha no nada?

A armadura afetiva seca a alma...
A alma se hidrata de fertilizantes da convivência com ternura e gratidão do encontro.
Os laços que damos nos cadarços dos sapatos dão firmeza no caminhar... Calçam a nossa existência. Sem eles com o tempo nos tornamos descalços e suscetíveis a machucados ao andarmos.

Laços estão longe de serem Nós.
Crie laços em tudo que faz, em todos que ama para que sua alma possa se sentir conectada e portanto acompanhada.

Como tão bem disse Clarice Lispector: Pertencer é Viver!!!"


Prof. Manoel Thomaz Carneiro

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É para refletir mesmo...o que estamos fazendo nas nossas relações?
Fiquei sem ter o que dizer diante dos escritos do Prof  Manoel Thomaz Carneiro e quis dividir com vocês.
Boa semana e que estas palavras despertem em vocês uma reavaliação na forma de relacionar-se.
Tais

2 comentários:

  1. Interessante reflexão.Fizeram um filme com a imagem dessa garotinha no espaço da mãe morta... lindo filme, por sinal

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  2. Fortíssimo e verdadeiro achado para reflexão. Gostei e ja li 2 vezes. Bom domingo

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