domingo, 19 de abril de 2020

Dois tipos de felicidade

perrier orphée devant pluton.jpg
"Antigamente, quando os deuses ainda pareciam bem próximos dos seres humanos, viviam numa pequena cidade dois cantores de nome Orfeu.

Um deles era o grande Orfeu. Inventara a cítara, precursora da guitarra, e quando dedilhava suas cordas e cantava, a natureza em torno ficava enfeitiçada. Animais ferozes e deitavam mansamente a seus pés, as altas árvores se curvavam para ele. Nada podia resistir a seus cantos, como era tão grande, cortejou a mais bela mulher. Depois começou declínio.

Enquanto ainda celebrava as bodas, morreu sua bela Eurídice, e a taça cheia partiu-se no momento em que era brindada. Mas, para o grande Orfeu, a morte ainda não era o fim. Valendo-se de sua arte requintada, encontrou a entrada do mundo subterrâneo, desceu ao reino das sombras, atravessou o rio do esquecimento, passou pelo cão dos infernos, apresentou-se vivo ante o trono do deus da morte e o comoveu com seu canto.

A morte liberou Eurídice, porém sob uma condição. Orfeu estava tão feliz que não percebeu o ardil oculto por trás do favor. Retomou o caminho de volta, ouvindo atrás desse os passos da mulher amada. Passaram ilesos pelo cão dos infernos, atravessaram o rio do esquecimento, começaram a subida em direção a luz, e já avistaram ao longe.

Então, Orfeu ouviu um grito - Eurídice tropeçara. Virou-se horrorizado, ainda viu a sombra desaparecendo na noite, e ficou só. Fora de si pela dor, cantou sua canção de despedida: "Ai de mim, eu a perdi, toda minha felicidade se foi! "

Ele próprio retornou a luz, mas no reino dos mortos passara a estranhar a vida. Quando algumas mulheres ébrias quiseram levá-lo à festa do vinho novo, ele recusou, e elas o despedaçaram em vida.
Tão grande foi a sua desgraça e tão inútil foi sua arte. Porém todo mundo o conhece!

O outro Orfeu era o pequeno. Era apenas um músico ambulante que se apresentava em pequenas festas tocava para gente humilde, alegravam pouco e se divertia com isto. Como não podia viver de sua arte, aprender um ofício comum, casou-se com uma mulher comum, teve filhos comuns, pecou eventualmente, foi feliz de uma forma totalmente comum, morreu velho insatisfeito com a vida.

Mas, ninguém o conhece - exceto eu!
No Centro Sentimos a Leveza- Bert Hellinger
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    "As histórias podem dizer o que não pode ser expresso de outra forma, pois também sabem ocultar o que mostram.Encaramos a sua verdade como pressentimos, por trás de um véu, o rosto de uma mulher.
      Quando as ouvimos nos sentimos como se entrássemos numa catedral. Estando na obscuridade, vemos os vitrais iluminados. Mas, quando as luzes se acendem, só percebemos a moldura."

Nunca vi uma explicação melhor para as  histórias... uma metáfora que nos ajuda a olhar para aquilo que está oculto!
A felicidade nos parece sedutora e enganosa, atraente e perigosa. Pois, muitas vezes, o que desejamos nos traz desgraça, e o que tememos nos deixa felizes. Às vezes, preferimos nos apegar à desgraça, por nos parecer segura ou maior, ou porque a consideramos como inocência ou como  merecimento, ou porque vemos como um penhor da felicidade futura.
Então. talvez, desprezemos a felicidade como corriqueira ou como transitória e fugaz. Ou então a temamos como culpa e traição, como uma afronta ou como prenunciadora de desgraça...
Pensemos!

Boa semana. Se cuidem, se protejam da melhor forma possível. Tenho visto muita imprudência na cidade: abraços, máscaras abaixo do queixo, nariz fora da proteção (oi?), etc...  
Trabalhe e saia, se necessário, mas proteja-se.
Tais

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