domingo, 7 de fevereiro de 2016

Mudança de Vida aos 40 anos


"Quando fiz 40 anos disse para mim: a outra metade da vida vou fazer o que vim fazer! Hoje eu penso que foi o melhor decreto que fiz a mim mesma, mas pretendo ir além da outra metade, lá pelos 96 anos.

Mudar de vida depois dos 40 é um mito. Para muitos, algo impossível. Mas nada é impossível quando a alma não é pequena. Nossa vida é do tamanho da nossa mente. E a gaiola em que vivemos é do tamanho do nosso medo. Nem sempre a gaiola está com a porta fechada e podemos voar quando quisermos. Acontece que inventamos portas e cadeados invisíveis, cheios de argumentos e teorias para justificar nossas limitações. Quando justifica muito, é sinal que a verdade está longe. Esse é um bom parâmetro para medir o quanto a situação pede mudança.

Era bancária, estava infeliz e não me via fazendo a mesma coisa nem um ano a mais. O futuro no banco era um vazio para mim, sem brilho, sem perspectiva, sem sonho. Já percorria o caminho de autoconhecimento há algum tempo e quanto mais olhava para dentro, menos conseguia mentir sobre isso. Não conseguia fugir da realidade que o momento sinalizava. Ou é agora, ou nunca! Foi impactante, um marco, um divisor de águas. Saí do banco, pedi demissão e saltei no escuro. Sabia que queria trabalhar com cura e ponto. O quê, exatamente, era uma interrogação. Comecei do ponto zero, como uma folha em branco e escrevi outra história.

Nessa entrega, caí nos braços generosos da providência e fui acordando o adormecido, me recordando e gostosamente me sentindo em casa. Era um sinal que o caminho estava aberto: a sensação de estar em casa, de fazer aquilo sem esforço, com leveza e amorosidade. Acredito que seja a entrega que os mestres se referem: sem controle, sem garantias, sem certezas. Não é algo irresponsável ou coisa assim. É uma certeza desconhecida e uma força inexplicável que permeia tudo. Ao mesmo tempo olhando para fora é incerto, algo dentro diz que o caminho é esse. Isso eu chamo de fé. Quem está de fora diz que você está louco, mas você sente que é o momento de maior lucidez de sua vida.

A cura que fazia parte de um projeto se tornou um processo. Começou dentro de mim, claro. E esse é o caminho de todos nós. Queremos nos construir, nos tornar, vir a ser. Mas tem tanta coisa guardada no baú precisando de limpeza, que a transformação não acontece. Ficamos colecionando coisas e frases de efeito, mas a dor continua ali, machucando onde tem que machucar. Então, cansei de chorar e um dia decidi: vou me liberar disso! Chega de recriar esse sofrimento. Esse decreto bastou. A decisão de escolher e não olhar mais para trás. Ponto zero de agora em diante. Uma vez a página virada, os capítulos mudaram o rumo da história. Costumo dizer que tive duas vidas em uma vida. Quanta coisa nova a partir de uma escolha. Um novo rumo, novo roteiro, valores, visão de mim mesma e do outro.

Eu precisava saltar no escuro. Esse era o preço. Achei justo para uma pessoa medrosa e acomodada, que queria garantias de que o risco seria mínimo. A vida pede mais, só isso que tenho a dizer. Foi uma lição e hoje agradeço o que a vida me pediu. Soltar muletas, acomodações, regras, repetições. Sair da zona de conforto, fazer diferente. Abrir mão, pagar o preço. Ceder, pedir. Errar, aprender. Trabalhar pelo salário no fim do mês e perceber que não é só por aí. Valeu, valeu cada passo. Hoje estou feliz, reconheço-me nesse espaço, sinto que faço parte de algo importante na vida das pessoas e isso faz uma tremenda diferença.

Mudar aos 40 é possível. Desse paradigma, pude sair do outro lado. Quem não tem esse fantasma? Eu também tinha. Às vezes ele me assombrava e dizia que era loucura largar tudo com essa idade! Mas que idade, ainda não estou nem começando, tenho essa sensação. Até os 96 tem muito chão pela frente. No embalo que vai, terei mais uma, duas, três vidas na mesma vida. Viver, viver, viver, isso é o que importa. Lamentar pelo que não fez é um peso e não resolve. Não temos nada além do agora e esse instante passa ligeiro. Ou vive e experimenta o novo, ou nunca vai saber o sabor. Quantas coisas deixamos de fazer e depois perdem o sentido? Foi bom, aquele era o meu momento e o coração estava aberto para perceber.

Hoje perto dos 50 anos, sinto outra mudança acontecendo. Mais intensa, mais profunda, mais madura. Que alegria perceber os ciclos da vida e render-se a eles. É um aprendizado rico estar em sintonia com o abrir e fechar das possibilidades dentro de nós. Saber que um dia queremos ir para a caverna e não brigar com isso. Não vamos ficar lá para sempre, é só uma temporada. Faz parte o recolhimento e repouso. É cíclico também. Depois a gente coloca a cabeça de fora e quer sentir o sol novamente. Dá vontade de criar, movimentar-se, fazer diferente. Outro movimento, que logo vai terminar. Algo surge, algo desaparece. Sem apego, sem aversão, podemos sentir cada movimento desses com contentamento e equanimidade. 40, 50, 60 anos, tanto faz. Não somos nossa idade. Sempre é tempo de começar algo novo. Sempre criamos nossa história e reescrevemos nossas experiências. Importa é como estamos diante do que acontece. Se é o amor ou o medo que nos move. Eu escolhi o amor e foi maravilhoso!"

Valéria Bastos

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